Vivemos em um tempo em que tudo se converte em imagem: redes sociais, telas, publicidade, memes, vídeos curtos. As imagens já não servem apenas para ilustrar: moldam opiniões, criam sentidos e manipulam emoções. Mas, em meio a tanta abundância, quase nunca somos educados para interpretar o que vemos.
É dessa urgência que nasce a alfabetização para o olhar. Assim como aprendemos a ler e escrever palavras, precisamos também aprender a “ler imagens”. Ver é natural, acontece biologicamente. Enxergar, porém, é cultural: exige consciência, crítica e distanciamento.
Alfabetizar o olhar vai além da ideia de apenas decifrar uma fotografia ou um vídeo. É entender que toda imagem é construída e que cada recorte traz intenções, omissões e escolhas. Uma fotografia nunca é somente um reflexo: ela é narrativa, é discurso e, claro, ideologia.
Isso implica: Ir além do consumo passivo, significa questionar o que vemos e reconhecer a potência simbólica e política das imagens.
A escola sempre priorizou o texto escrito. Mas no século XXI, vivemos sob a cultura visual. O excesso de imagens pode gerar superficialidade, ansiedade e manipulação. Alfabetizar o olhar é resistência, é transformar espectadores passivos em sujeitos críticos.
O escritor Guy Debord chamou nossa época de “sociedade do espetáculo”. Nela, tudo é visto e exibido. Mas enxergar vai além de consumir, nos leva a decifrar códigos, reconhecer afetos, nos propõe perceber discursos escondidos.
Projetos de educação visual podem mudar nossa relação com o mundo.
A fotografia, em especial, é um exercício de atenção: ensina a observar, ensina a enquadrar, narrar e também a compartilhar. É um convite a enxergar.
Alfabetizar o olhar também é uma questão de ética. Como reagimos diante de imagens violentas ou manipuladas?
Como ensinar jovens a usar a fotografia para incluir e não excluir, para libertar e não aprisionar?
Como lidamos com imagens de sofrimento, violência, corpos estereotipados?
Como ensinamos as novas gerações a usar câmeras não para julgar, mas para compreender? Para incluir, não para exibir? Para libertar, não para aprisionar?
“Ver” é automático. “Enxergar” é um ato político.
É um exercício de lucidez e responsabilidade.
E pode, e deve, ser ensinado.
A alfabetização para o olhar não é um luxo pedagógico. É urgência.
Porque, no mundo que temos, quem não enxerga, é facilmente manipulado.
Fotógrafo e agente cultural.
Presidente do COFIT, diretor de Comunicação da Fototech e membro do Conselho Fiscal da Confoto. Atua com foco na preservação da memória cultural e no fortalecimento do fotoclubismo no Brasil, valorizando a fotografia como ferramenta de pertencimento.



